Diretor do Museu de Zoologia da USP por três décadas, zoólogo e compositor participou do movimento de professores e pesquisadores que propuseram a criação da FAPESP (foto:Juca Martins)
Fonte: REVISTA FAPESP Especiais
Por Claudia Izique
Agência FAPESP – “Quando Deus me fez zoólogo sabia o que estava fazendo”, costumava dizer Paulo Emílio Vanzolini, que morreu no dia 28 de abril, aos 89 anos, acometido por pneumonia. Formado médico pela Universidade de São Paulo (USP) em 1947 – apenas para conhecer melhor os vertebrados, ressalvava –, dirigiu por 31 anos o Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (USP), tendo sido responsável pela formação de uma excepcional coleção de espécies, “uma das melhores do mundo”, orgulhava-se.
Parte dessa coleção ele próprio coletou ao longo de 11 mil quilômetros de rio na Amazônia, num barco de pesquisa financiado pela FAPESP. “Andava no mato e comprava bicho: quinhentos reais uma lagartixa, cinco mil reais uma cobra”, contou em depoimento ao Museu da Pessoa, publicado em novembro de 2011. Por 40 anos, andou atrás de répteis e anfíbios pelo Brasil inteiro.
Em 2010, 47 dos seus mais de 150 artigos científicos foram reunidos no livro Evolução ao Nível de Espécie: Répteis da América do Sul, organizado por Andrea Bartorelli, Murilo de Andrade Lima Lisboa, Virginio Mantesso-Neto e Dione Seripierri e apoiado pela FAPESP.
A sua ligação com a FAPESP era, aliás, histórica. “Vanzolini participou do movimento de professores e pesquisadores que propuseram a criação da FAPESP e, no governo Carvalho Pinto, teve um contribuição fundamental para a estruturação da instituição e pela concepção do modelo de organização que rege a Fundação até hoje”, afirma Celso Lafer, presidente da FAPESP. “Lamento profundamente a sua morte. Vanzolini era alguém por quem eu tinha grande admiração.”
Assessor científico da Secretaria de Agricultura, Vanzolini, que integrava o grupo que, em 1959, reunia-se com Plínio de Arruda Sampaio, então subchefe da Casa Civil e responsável pelo Plano de Ação do governo, redigiu o anteprojeto de criação da FAPESP.
“Aí o Carvalho Pinto me mandou estudar o assunto, fui para os Estados Unidos, conversei com o pessoal das fundações Guggenheim e Ford. Me vali muito das conversas que tive com Henri Allen Moe, secretário do Guggenheim, essa ideia de desburocratizar a FAPESP veio de lá. Fiz o projeto de lei que passou na Assembleia”, contou Vanzolini à revista Pesquisa FAPESP, em junho de 2002.
“Na questão de recursos financeiros, fiz uma coisa que foi alvo de muitas críticas. Fiz o que a Fundação deve fazer: a FAPESP deve investir. Aliás, tem por obrigação, por lei, investir uma parte de seu orçamento para garantir o patrimônio,” afirmou em entrevista publicada no livro FAPESP 40 anos – Abrindo fronteiras, organizado por Amélia Império Hamburguer, em 2004, editado pela Edusp/FAPESP.
Vanzolini foi membro do primeiro Conselho Superior da Fundação e conselheiro entre 1961-1967, 1977-1979 e 1986-1993.
O cientista e pesquisador foi também um dos grandes nomes do samba paulista, compositor de clássicos como Ronda, Praça Clóvis e Volta por Cima. Ainda na faculdade de Medicina, integrou as “caravanas” musicais do Centro Onze de Agosto, da Faculdade de Direito, participando de shows no interior. Mas a paixão pela música veio na virada de 1948 para 1949 em Boston, quando fazia doutorado na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.
“Na primeira vez que entrei num bar de jazz eu quase desmaiei”, contou ao Museu da Pessoa. A primeira música gravada foi Ronda, escondida no lado B de Moda da Pinga, com Inezita Barroso, que só fez sucesso mais tarde, na voz de Márcia. Ganhou dinheiro com Volta por Cima. “Comprei livro. Comprei uma biblioteca inteira de livros antigos”, contou. “Eu comprava e não perguntava o preço. Comprava em dólar.”
Vanzolini foi membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico, premiado pela Fundação Guggenheim, em Nova York, por sua contribuição para o progresso da ciência e ganhador do Prêmio Conrado Wessel 2011.
Foi homenageado com a nominação de pelo menos 15 táxons de insetos, anfíbios, répteis, aracnídeos e até um mamífero – Alpaida vanzolinii (1988), Vanzosaura ( 1991) e Anolis vanzolinii(1996), entre outros. Seu corpo foi enterrado nesta segunda-feira, 29 de abril, no Cemitério da Consolação, em São Paulo.