Sancionada com vetos, a nova lei de proteção de nossas florestas está longe de ser aquilo com que sonhavam os ambientalistas, mas parece que é o limite a que pode chegar a presidente Dilma Rousseff e sua equipe, e supera em muito aquilo que temíamos acontecer, diante do furor e truculência da execrável bancada ruralista. Podemos, portanto, de certa forma, comemorar a volta à legalidade e a precária neutralização dos inimigos do Brasil.
Em uma de suas brilhantes e lúcidas manifestações, o cientista Aziz Ab´Saber afirmou que, em lugar de um "Código Florestal", o que deveríamos ter é um "Código Ambiental", ou "Código da Biodiversidade"! Sim, porque as florestas são apenas uma das feições visíveis do Meio Ambiente, e talvez não a mais importante. Antes dela viria, com certeza, o gerenciamento e manejo das águas. Sem elas, não haveria florestas, nem animais, nem seres humanos. Cuidar, portanto, das bacias hidrográficas em sua totalidade seria cuidar e preservar o Meio Ambiente e assegurar o futuro do Planeta, nele considerando-se a existência e a dignidade do Ser Humano.
Longe, porém, da medíocre compreensão dos "representantes do povo brasileiro", resta apenas o que foi sancionado, vetado e complementado através de medidas provisórias pela presidente Dilma e seus assessores: o "novo" Código Florestal. A proposta do grupo palaciano foi resgatar o "projeto" do Senado e acrescentar critérios para sua operacionalização. Esse "projeto" já foi exaustivamente discutido e questionado pelos ambientalistas, de modo que não me reportarei a aspectos menores. O importante é que se mantiveram os critérios de definição das Áreas de Proteção Permanente em sua íntegra, ou seja: topos e encostas de morros, matas de galeria nas margens dos cursos dágua, terras úmidas, pântanos e manguezais. No entanto, reduziu-se a obrigatoriedade de recuperação das APP´s a, no máximo, 100 metros das margens dos rios; segundo a ministra do Meio Ambiente, foram ouvidos a EMBRAPA, a ANA e outras instituições "científicas", além de se "estudar" as legislações de outros países, como os Estados Unidos (que já desmataram quase todas as suas florestas), e constatou-se que, além de 100 metros, "não haveria impacto sobre os cursos dágua" (sic).
À parte a falácia desses argumentos, o "projeto" sancionado é bem menos nocivo do que a aberração jurídica, indecente e imoral, proposta pelos ruralistas. Outro aspecto a se destacar foi a ênfase na diferenciação das pequenas propriedades rurais, que representam 81% de todos os agricultores do país (em propriedades de até 2 módulos fiscais), dos latifúndios ruralistas, que não passam de 2% de todos os agricultores do país. Para os pequenos agricultores, a área devastada a ser recuperada não poderá ultrapassar 10% da propriedade; para os latifundiários, a recuperação será integral, limitada, porém, à nova faixa proposta de 100 metros (no máximo) de matas ciliares (matas de galeria) dos rios.
No entanto, como já comentei em postagens anteriores, a presidente Dilma não conta com maioria na câmara de deputados, o que foi evidenciado na última votação, e que demonstrou que o governo não possui aliados confiáveis no congresso. Portanto, quem pode se dar bem no final desse processo são os latifundiários, uma vez que o veto de Dilma poderá ser derrubado por apenas 257 deputados! Na última votação o governo perdeu por 400 votos!
Mas nem isso é tão importante quanto a consciência de que a solução correta e desejada pelos cientistas e ambientalistas é a tese do "Desmatamento ZERO"! Sim, porque não adianta aprovar qualquer lei se ela não for cumprida; a legislação atual vigora há mais de 30 anos e nunca foi cumprida; e nenhum latifundiário pagou multas ou recuperou áreas desmatadas! Pior do que isso, continuam desmatando à revelia da Lei! Isso é desobediência civil! E ninguém, nem mesmo a Justiça, toma qualquer decisão! Só nos estados de Mato Grosso, terra de Blairo Maggi, o maior devastador desse país, e de Rondônia, as áreas desmatadas já representam mais de 50% do território!
Por que "desmatamento ZERO"? Existem duas razões básicas: em primeiro lugar, as lavouras e pastos brasileiros tem baixa produtividade média e poderiam ser muito melhor aproveitadas, com aumento da produção sem nenhum acréscimo de terras agricultáveis. Em segundo lugar, as terras agrícolas de nosso país já atingiram e ultrapassaram os limites do bom-senso, colocando em risco os aquíferos, as florestas e todas as áreas de proteção permanente, Se não precisamos de mais terras para a agricultura, se não sabemos tirar da terra o que ela tem a oferecer apenas pelo uso de técnicas agrícolas adequadas, e se nossos ecossistemas já se encontram ameaçados, nada justificaria a expansão das fronteiras agrícolas, a não ser a ambição descontrolada dos latifundiários!
Outro argumento ainda mais sólido e expressivo é o valor dos recursos naturais: está consolidada a certeza de que a humanidade cresce a um ritmo insustentável. Apenas nos últimos sessenta e cinco anos a população da Terra triplicou de tamanho. Estima-se que, para dobrar de tamanho não serão necessários mais do que 40 anos, ou seja, antes de 2050 já teremos gravíssimos e talvez irreversíveis problemas de abastecimento de água no planeta. Hoje já somam cerca de dois bilhões de seres humanos passando sede e fome! Soja e gado não são alimentos para a maioria da população da Terra; a soja é usada, principalmente, na produção de ração animal para o gado, um círculo vicioso em que quase não entra o Homem. Portanto, dentro de duas décadas, três talvez, a água será um bem mais precioso do que o ouro ou o petróleo!
É sabido que temos cerca de 12,5% de toda água potável do mundo! Somos, portanto, e mais uma vez, um país privilegiado... só que nossos governantes são cegos e nossos empresários, míopes e oportunistas; querem ganhar muito e gastar nada; querem explorar a terra até a exaustão e abandoná-la quando nada mais tiver a oferecer! Como se eles não tivessem a responsabilidade de cuidar e restaurar a terra depois de extrair dela suas fortunas malditas! Isso porque essas terras são ocupadas ilegalmente por eles!
Finalmente, entre perdas e ganhos, quem perde é a Natureza e quem ganha são os mesmos latifundiários que, aparentemente, foram derrotados nessa decisão da presidente Dilma!
Um comentário:
Combativo como sempre, seu texto é impecável e aprendo muito aqui... obrigada! E vamos para o Desmatamento ZERO!
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