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Autora: Flavia Londres
Vejam a apresentação:
O livro Agrotóxicos no Brasil – um guia para ação em defesa da vida é uma produção revestida de caráter histórico. Leitura essencial para quem luta na defesa da vida e por um modelo de desenvolvimento alternativo para o campo.
O primeiro motivo dessas afirmações se deve ao fato da quase ausência de material educativo produzido pelo setor público informando a população sobre os riscos do uso dos agrotóxicos no Brasil. Esse campo é hegemonizado por quem produz os agrotóxicos, preconizadores de seu uso seguro, mito, analisado e desconstruído nesse importante livro, escrito com muita competência por Flavia Londres.
Outro aspecto merecedor de destaque nessa obra, trata-se da visão dos movimentos sociais liderados pela Articulação Nacional de Agroecologia e Rede Brasileira de Justiça Ambiental sobre esse processo, olhar muitas vezes desqualificado pelos grandes grupos econômicos ou mesmo por alguns cientistas.
Podemos afirmar que os textos apresentados guardam um minucioso cuidado com as fontes e referências, se baseando em pareceres de pesquisas e documentos oficiais. O leitor tem em mãos um livro com abordagem interdisciplinar inovadora.
Sua forma de guia propicia um próspero dialogo entre a saúde, o meio ambiente e a agricultura sem perder a perspectiva da ação, ou seja, de construir uma práxis. A saúde, no contexto apresentado, é um verdadeiro termômetro do atual modelo de desenvolvimento no campo. Apesar da precariedade da ação pública em todas as etapas da cadeia produtiva dos agrotóxicos, é na sub-notificação das intoxicações, na invisibilidade do problema para a nossa sociedade que esse guia vem desnudar de uma forma clara e pedagógica a necessidade de transformarmos o atual quadro de descontrole e contaminação associado ao uso de agrotóxicos no Brasil.
Os textos confirmam a importância da realização dos diálogos de saberes. Temos um grande desafio para produzir conhecimento voltado para a construção de um sistema de vigilância da saúde que proteja a vida e contribua na implantação de sistemas produtivos mais saudáveis. Existe uma experiência acumulada dos povos que vivem nos campos e nas florestas, e essas vozes precisam ser mais ouvidas.
A informação aqui contida poderá ser um grande instrumento para militantes sociais, estudantes, professores, ambientalistas, profissionais de saúde, extensionistas rurais e agricultores na luta por um campo mais saudável.
Esse guia é um grande passo para novos diálogos e convergências na articulação das redes de agroecologia, justiça e saúde ambiental, soberania alimentar e economia solidária na construção de um outro modelo de desenvolvimento para o campo no Brasil: sustentável, saudável e justo.
Fernando Ferreira Carneiro
Doutor em Epidemiologia pela Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais, Professor Adjunto da Universidade de Brasília-UnB, Faculdade de Ciências da Saúde, Departamento de Saúde Coletiva e Pesquisador do Núcleo de Estudos de Saúde Pública da UnB. Membro do GT de Saúde e Ambiente da Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva - ABRASCO
Vejam trechos do Livro:
"Mas foi na última década que o uso de agrotóxicos no Brasil assumiu as proporções mais assustadoras. Entre 2001 e 2008 a venda de venenos agrícolas no país saltou de pouco mais de US$ 2 bilhões para mais US$ 7 bilhões, quando alcançamos a triste posição de maior consumidor mundial de venenos. Foram 986,5 mil toneladas de agrotóxicos aplicados. Em 2009 ampliamos ainda mais o consumo e ultrapassamos a marca de 1 milhão de toneladas – o que representa nada menos que 5,2 kg de veneno por habitante! Os dados são do próprio Sindag (Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola), o sindicato das indústrias de veneno. Devido à repercussão negativa que o aumento do uso de venenos começou a causar nos meios de comunicação, a organização não divulgou o volume de agrotóxicos comercializado em 2010, mas apenas o faturamento do setor: US$ 7,2 bilhões (9% a mais que o ano anterior)." (O Brasil é o destino de agrotóxicos banidos no exterior) 'Levantamentos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola (Sindag), ambos de 2009, apresentam o crescimento de 4,59% da área cultivada no período entre 2004 e 2008. Por outro lado, as quantidades vendidas de agrotóxicos, no mesmo período, subiram aproximadamente 44,6%. E os números não levam em conta a enorme quantidade de agrotóxico contrabandeado para o país.' (Carneiro, F. e Soares, V., 2010). Ou seja, o aumento recente do envenenamento dos campos é gritante."
"O uso seguro de agrotóxicos é possível?"
"O debate acerca dos agrotóxicos e suas implicações sobre o ambiente e a saúde humana tem sido majoritariamente encaminhado, desde o começo da Revolução Verde, para a possibilidade e a necessidade de aceitar o uso deles e estabelecer regras que garantiriam a proteção das diferentes formas de vida expostas a biocidas – seria o paradigma do uso seguro, também aplicável a outros agentes nocivos, como o amianto.
Mas a pergunta que se faz é: no contexto em que vivemos hoje, é possível fazer valer o uso seguro dos agrotóxicos? Em primeiro lugar, é preciso considerar a magnitude do uso de agrotóxicos no país: o Brasil é o país que mais consumiu estes produtos no mundo em 2008, ultrapassando sua própria marca em 2009. No último ano para os quais se tem dados, foram consumidas mais de 1 milhão de toneladas, o que corresponde a mais de 22 kg por hectare de lavoura, ou ainda cerca de 5,2 quilos de agrotóxicos por habitante (e transferiu US$ 6,62 bilhões para a indústria química)1.
Em segundo lugar, é preciso avaliar a extensão do universo em que o uso seguro dos agrotóxicos teria que ser garantido: segundo dados do IBGE oriundos do Censo de 2006, são 5,2 milhões de estabelecimentos agropecuários, espalhados por todo o país, ocupando área correspondente a 36,75% do território nacional. O setor envolve 16.567.544 pessoas ocupadas (incluindo produtores, seus familiares e empregados temporários ou permanentes), que correspondem a quase 20% da população ocupada no país. Haveria que incluir aqui ainda, entre a população exposta, os trabalhadores das fábricas e do comércio destes produtos, os moradores do entorno desta indústria,
os expostos em usos não-agrícolas (as dedetizadoras, por exemplo) e, afinal, todos nós consumidores de alimentos contaminados – nossa dose diária de venenos...
Em terceiro lugar, estariam as condições institucionais para o Estado fazer valer as regras do jogo em toda esta extensão: aqui vão pesar as deficiências das políticas públicas, feridas pelo peso do neoliberalismo sobre a composição dos quadros de pessoal e a infraestrutura para execução das políticas, inclusive da fiscalização e vigilância. "
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