segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Eleições do Mensalão

Ao contrário do que afirmavam analistas políticos, o julgamento do assim chamado "Escândalo do Mensalão" não representou problema para o Partido dos Trabalhadores, que teve seu espaço político aumentado, e não favoreceu o PSDB, que não ampliou seu eleitorado em função do julgamento dos antigos líderes do PT, notadamente Dirceu e Genoíno. A maior evidência disso foi a passagem para o segundo turno de Haddad, político desconhecido em São Paulo, e que iniciou a campanha com cerca de 3% de intenções de voto e chegou ao segundo turno com seu desafeto Serra, cujas margens de rejeição demonstraram ser muito maiores do que as do PT.

Agora, às vésperas do segundo turno, Haddad mantém expressiva vantagem de 16 pontos percentuais sobre seu oponente. Essa situação evidencia o poder de influência do ex-presidente Lula que, contra todas as expectativas, ofereceu o nome de Haddad para enfrentar o PSDB de Serra, o PRB de Russomano e o PMDB de Chalitta, que iniciaram a campanha com grande vantagem sobre o PT. Russomano, até às vésperas do 1º turno era apontado como provável oponente de Serra no 2º turno. Essas mudanças de preferências eleitorais têm duas explicações: a primeira demonstra a fragilidade desse processo de análise e interpretação das intenções de voto do eleitorado, e descredenciam as metodologias estatísticas de previsão de resultados; a segunda explicação está mais ligada ao desinteresse e despreparo do eleitorado com relação à escolha de seus governantes.


O que deveria ser fator de manipulação política do eleitorado, mostrou-se uma arma apontada para todo o sistema político brasileiro, uma vez que já não se distinguem bons e maus partidos políticos, todos envolvidos nas mesmas práticas oportunistas, manifestadas pelas barganhas de cargos e vantagens em troca de apoio em todos os níveis do poder legislativo e executivo. O PT, que era considerado um partido ÉTICO, perdeu sua aura de honestidade ao envolver-se no maior escândalo da História da República e ao recusar-se à autocrítica esperada pelos brasileiros. Ocorre que, na fila de espera das pautas do Supremo Tribunal Federal estão o PSDB, com o "Mensalão Mineiro", e o DEM com o "Mensalão de Brasília".

Durante todos os anos de espera pelo julgamento do STF todos apontavam para mais uma "PIZZA" a ser servida pelo STF, isentando de culpa os medalhões do PT. Porém, graças à decisiva e inteligente estratégia do relator Joaquim Barbosa, os réus foram sendo condenados, um a um, nos crimes de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, crimes financeiros, etc. E agora, exatamente neste momento, o STF julga o último crime, de formação de quadrilhas, justo no momento em que alguns ministros do STF tiram suas máscaras e passam a inocentar todos os acusados. Lewandowski, Tófoli, Rosa Weber e Carmen Lúcia exibem sua verdadeira face aos brasileiros!
Seja como for, essa reviravolta final nos resultados do julgamento terá efeito muito mais devastador para o PT do que a esperada condenação dos réus. Sentindo-se traídos pelos seus magistrados, provavelmente os eleitores de São Paulo se rebelarão contra a pantomima agora evidenciada, e tenderão a mudar seus votos, revertendo as expectativas das pesquisas de última hora. Se isso será suficiente para assegurar a vitória do PSDB ainda não se pode afirmar; mas certamente será a comprovação de que nosso modelo de "democracia" está falido, fracassado e comprometido com as piores práticas!


Não são apenas dois poderes que se ofereceram para encenar essa farsa, mas os três poderes! E isso não é surpreendente, uma vez que quase todos os ministros do STF foram nomeados pelo ex-presidente Lula e agora por Dilma Rousseff, que ainda tem uma carta nas mangas, que poderá ser utilizada caso alguma coisa ainda "saia do controle": será a posse do novo ministro Teori Zavascki antes da deliberação final de desempate e da atribuição das penas aos réus condenados. Ou seja, ninguém irá para a cadeia ou, se for, será beneficiado, como réu primário, a penas alternativas; na pior das hipóteses, uma condenação branda e uma reclusão doméstica!

Ficará apenas a imagem de um guerreiro que não se deixou abater, e desmascarou aqueles que tentavam manter a imagem de homens probos e dignos enquanto, em seus votos, demonstravam a traição à Nação e ao povo brasileiro. Joaquim Barbosa merece nossa admiração e respeito, tanto pela sua postura ética e firme, como pelos esforços em se manter ativo, mesmo diante de seu estado de saúde precário, expressando, horas a fio, seu trabalho magnífico de ordenar as denúncias e apresentar suas sentenças!

As "Eleições do Mensalão" poderiam ter se tornado um marco a estabelecer um recomeço de nossa Democracia e o reencontro com o Estado de Direito, sepultando definitivamente a mentira e resgatando a honra a que se referia Ruy Barbosa em sua frase mais emblemática:


"De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça; de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto."

Números alarmantes da crise atual

Fonte: O Estado de São Paulo 19/10/2012

O historiador Eric J. Hobsbawn, que morreu no começo da semana passada, deixou livros em que caracterizou de forma contundente os tempos que estamos vivendo.”Quando as pessoas não têm mais eixos de futuros sociais acabam fazendo coisas indescritíveis”, escreveu ele no ensaio Barbárie: Manual do Usuário (ESTADO, 2/10). Ou então: “Aí está a essência da questão: resolver os problemas sem referências do passado.” Por isso, certamente Hobsbawn não se espantaria com a notícia estampada neste jornal poucos dias antes de sua morte:”Na Espanha, cadeados nas latas de lixo” (27/9). “Com cada vez mais pessoas vivendo de restos, prefeitura (de Madri) tranca as latas como medida de saúde pública”. Nada haveria a estranhar num país onde a taxa de desemprego está por volta de 25%, 22% das famílias vivem na pobreza e 600 mil não têm nenhuma renda.

E que pensaria o historiador com a notícia (ESTADO, 26/9) de que as autoridades de Bulawato, no Zimbábue, África, “pediram aos cidadãos que sincronizem as descargas de seus vasos sanitários para poupar água (…) Os moradores devem esvaziar os vasos apenas a cada três dias e em horários determinados”. Provavelmente Hobsbawn não se espantaria, informado das estatísticas da ONU, segundo as quais 23% da população mundial (mais de 1,5 bilhão de pessoas) defecam ao ar livre, por não terem instalações sanitárias em suas casas. As do Zimbábue ainda estão à frente.

E da China, que pensaria ele, ao ler nos jornais (22/9), que a Prefeitura de Xinjian, no Leste do país, “está sob intensa crítica da opinião pública após enjaular dezenas de mendigos no mesmo lugar durante um festival religioso”? Ao lado da foto das jaulas nas ruas com mendigos encarcerados , a explicação de autoridades, de que assim fizeram porque os pedintes assediavam peregrinos e corriam risco de ser atropelados ou pisoteados. Mas “entraram nas jaulas voluntariamente”. Será para não correr riscos desse tipo que “quatro estrangeiros de origem ignorada” vivem há três meses no aeroporto de Cumbica, São Paulo, recusando-se a dizer sua nacionalidade e procedência ? (Folha de S. Paulo, 29/9). “Em tempos de transformação”, disse o psicanalista Leopold Nosek a Sonia Racy (ESTADO, 7/10), “quando o velho não existe mais e o novo ainda não se estruturou, criam-se os monstros”.
Para onde se caminhará ? Na Europa, diz a Organização do Trabalho, que com todo o sul do continente em crise o desemprego na faixa dos 15 aos 24 anos crescerá 22% em 2013, pouco menos no ano seguinte. Nos Estados Unidos, a taxa de desemprego entre jovens está em 17,4%, talvez caia para 13,35 até 2017 (Agência Estado, 5/9). O desemprego médio nos 17 paises da zona do euro subiu para 11,4%.

Pulemos para o lado de cá. Um em cada cinco brasileiros entre 18 e 25 anos não trabalha nem estuda (Estado, 26/9). São 5,3 milhões de jovens. Computados também os que buscam trabalho, chega-se a 7,2 milhões. As mulheres são maioria. E o déficit acontece embora o país tenha gerado 2,2 milhões de empregos formais em 2011.
As estatísticas são alarmantes. A revista New Scientist (28/7) diz que 1% da população norte-americana controla 40% da riqueza. Já existem 1226 bilionários no mundo. “Nós somos os 99 por cento”, diz o movimento de protesto Occupy. Entre suas estatísticas estão as que os relatórios do Programa para o Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) vêm publicando desde a década de 90: pouco mais de 250 pessoas, com ativos superiores a um bilhão de dólares cada, têm, juntas, mais do que o produto bruto conjunto dos 40 países mais pobres, onde vivem 600 milhões de pessoas.. Já a metade mais pobre da população mundial fica com 1 por cento da renda global total.. E menos de 20% da população mundial, concentrada nos países industrializados, consome 80% dos recursos totais. 92 mil pessoas já acumulam em paraísos fiscais cerca de US$21 trilhões, afirma a Tax Justice Network (New Scientist, 28/7)

E que se fará, com a população mundial aumentando e com os recursos naturais – inclusive terra para se plantar alimentos – escasseando ? É cada vez maior o número de economistas que já mencionam com freqüência a “crise da finitude de recursos” Os preços médios de alimentos “devem dobrar até 2030, incluídos milho (mais 177%), trigo (mais 120% e arroz (107%)”, alerta a ONG Oxfam (Instituto Carbono Brasil, 6/9). 775 milhões de jovens e adultos são analfabetos e não têm como aumentar a renda (Rádio ONU, 10/9).

De volta outra vez ao nosso terreiro, vemos que “mais de 90% das cidades estão sem plano para o lixo” (ESTADO, 2/8). Na cidade de São Paulo, 90% do lixo reciclável vai para aterros sanitários (Ciclo vivo, 10/8). 5,4 bilhões de litros de esgotos não tratados são descartados diariamente. Perto de metade dos domicílios não são ligados a redes de esgotos. A perda de água nas redes de distribuição (por furos, vazamentos etc.) está por volta de 40% do total.. Mas 23% das cidades racionam água, segundo o IBGE (Estado, 20/10/11). E grande parte da água do rio São Francisco que será transposta irá para localidades com essas perdas – antes de corrigi-las. E com o líquido custando muito mais caro, já que muita energia será necessária para elevá-lo aos pontos de destino.

Enquanto isso a campanha eleitoral correu morna em praticamente todo o país, com candidatos fazendo de conta que vivemos na terra da promissão, não precisamos de planos diretores rigorosos nas cidades, não precisamos responsabilizar quem mais consome – e mais gera resíduos -, não precisamos impedir a impermeabilização do solo das cidades, nem impedir a ocupação de áreas de risco.

A sociedade de consumo – escreveu Hobsbawn – se interessa apenas pelo que pode comprar agora e no futuro”. Mas terá de resolver o problema de um bilhão de idosos em dez anos (Fundo de População das Nações Unidas, 1/10).

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Florestas vetadas

Fonte: GREENPEACE BRASIL
Dilma dá o último passo no processo do Código Florestal e, com vetos parciais, consolida legislação que tem pouco de proteção e muito de devastação. Sociedade civil se mobiliza por lei popular do desmatamento zero.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, anuncia o desmonte final do Código Florestal. Foto: Agência Brasil
 No apagar das luzes desta quarta-feira, o governo federal anunciou o veto parcial à Medida Provisória do Código Florestal, encerrando mais um capítulo de desmonte da legislação ambiental brasileira e passando um claro recado àqueles que por anos desmatam nossas florestas e apostam na impunidade: o crime valeu a pena.

“Apesar dos avisos de cientistas e estudiosos sobre o assunto, e da clara oposição de vários e diferentes setores da sociedade, Dilma escolheu o caminho do retrocesso ruralista. Durante todo o processo de desmonte da lei ambiental, o governo foi omisso ou foi conivente com a proposta do que existe de mais atrasado no agronegócio brasileiro”, diz Marcio Astrini, da campanha Amazônia do Greenpeace.
Daqui em diante, o país deixa de ter uma das legislações florestais mais modernas do mundo para dar lugar a uma lei sob medida para os interesses de um agronegócio ávido por expandir-se sobre áreas de floresta. A legislação virou uma colcha de retalhos em que o agronegócio – não a floresta – é a questão central. Além da anistia a desmatadores ilegais, a nova lei beneficia grandes latifúndios e traz brechas legais para mais devastação propositalmente deixadas na nova lei.
“A questão ambiental vive um de seus piores momentos sob a tutela do atual governo. Nunca vimos tantas más notícias vindas do Planalto em tão pouco tempo de gestão”, afirma Astrini.
Nos últimos dois meses, o desmatamento na Amazônia, maior floresta tropical do mundo, voltou a crescer, se comparado com o mesmo período do ano passado. Em agosto, houve um aumento de mais de 200% nas derrubadas. Nos últimos 50 anos, a Amazônia já perdeu mais de 720 mil km2, uma área equivalente à soma dos estados de Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina.
Os problemas em relação à ofensiva de desmatamento sobre as florestas estão apenas começando. A bancada ruralista já ataca também as unidades de conservação, as terras indígenas e quilombolas e a revisão dos índices de reforma agrária. O aumento no uso de agrotóxicos, a ampliação dos limites para a compra de terras por estrangeiros no país e, até mesmo, o enfraquecimento da legislação trabalhista no campo também estão na mira do agronegócio. “A agenda ruralista sempre foi clara. A diferença é que agora encontraram um governo disposto a barganhar com essa agenda”, diz Astrini.
As florestas são fundamentais para assegurar o equilíbrio do clima, a conservação da biodiversidade e o sustento de milhões de pessoas que dela dependem diretamente para sobreviver. No Brasil, essa vegetação é responsável por grande parte das chuvas que irrigam nossas plantações e que abastecem nossos reservatórios de água. Além disso, com o que já temos atualmente de terras abertas, podemos duplicar nossa produção de alimentos sem precisar derrubar mais nenhum hectare de floresta. Há atualmente mais de 30 milhões de hectares de terras degradadas somente pela pecuária improdutiva.
Para assegurar a proteção das nossas florestas é urgente que o Brasil tenha uma lei de desmatamento zero. Essa lei de iniciativa popular já conta com o apoio de quase 600 mil pessoas que assinaram a petição. “O texto escrito pelos ruralistas e aprovado pelo Planalto não traz regras para aumentar a proteção ambiental ou combater o desmatamento. Eles fizeram uma lei para o desmatador. Faremos uma lei pelas florestas.”

Dilma veta mudanças dos ruralistas no Código Florestal

Com certo constrangimento, quero cumprimentar Dilma Rousseff e sua Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, pela decisão de vetar nove pontos introduzidos pela bancada ruralista no Código Florestal. Ainda que esta seja uma pálida versão do que pretendiam os ambientalistas, a decisão resgata, parcialmente, a dignidade da Presidente da República, acuada pelos vorazes e desleais latifundiários, que queriam ver seus crimes ambientais "absolutamente perdoados" pelo desvirtuamento de nossa mais importante Lei Ambiental.

É evidente que os estragos causados no Meio Ambiente pelo agronegócio nos últimos 50 anos jamais serão recuperados, e as perdas já são contabilizadas como irreversíveis, seja pelo desaparecimento de expressivos territórios na Amazônia e na Mata Atlântica, seja pelas consequências da drástica redução das florestas tropicais e a trágica extinção de milhares de espécies animais e vegetais, seja ainda pela violenta expansão das fronteiras agrícolas e a introdução de imensas propriedades rurais de monoculturas em territórios que deveriam ser mantidos intactos, como santuários, para assegurar a vida no Planeta para as próximas gerações.


As perdas não se resumem ao evidente desmatamento da Amazônia; elas se estendem para os demais biomas nacionais, atingindo mortalmente os essenciais recursos hídricos do Cerrado, onde a redução do território degradado chega a alarmantes 50% de sua biomassa original, substituído que foi pela soja, pelo algodão e pelo gado.

Nunca é demais destacar a ausência de políticas públicas para o setor agropecuário, o que permite que esses estragos continuem a acontecer, sem que qualquer punição seja imputada aos criminosos ruralistas. Não será esse Código Florestal, assim como não foi sua versão original, que irá coibir os crimes ambientais. Muito pior do que a impunidade seria a ausência de instrumentos legais de coerção dos abusos e dos crimes que permitem o enriquecimento ilícito desses Inimigos da Pátria! Havendo a lei, conservamos a esperança de, um dia, vê-la respeitada... Assim como o "Mensalão" demorou nove anos para ser levado a julgamento, e agora poderá conduzir seus criminosos para a cadeia, o desrespeito ao Código Florestal poderá, um dia, ser levado ao Supremo Tribunal Federal que, por fim, decidirá se esses criminosos são passíveis de punição exemplar, cerceando-lhes a liberdade, imputando-lhes pesadas e exemplares indenizações financeiras, e obrigando-os a recuperar a floresta devastada e a se retirar dos santuários de vida selvagem por eles usurpados.

Talvez quando isso acontecer, seja tarde demais para resgatar nossas florestas. Talvez, se isso acontecer, a Natureza já não tenha mais cura e esteja em fase terminal. Ainda é uma questão em aberto para análise e reflexão dos pesquisadores o ponto de inflexão a partir do qual os estragos ambientais seriam irreversíveis, seja na Amazônia, seja no que resta da Mata Atlântica ou mesmo no Cerrado. No entanto, sabemos que o equilíbrio ecológico em áreas de preservação é extremamente crítico; prova disso são as clareiras da Amazônia que, mesmo depois de abandonadas pelos latifundiários, permanecem estéreis por décadas.


Mas voltando à questão do Código Florestal, quero remeter à  reflexão a excelente palestra de Aziz Ab´Saber: "Do Código Florestal para o Código da Biodiversidade", que publiquei neste blog em 30 de março de 2012, poucos dias depois de sua morte. O que ele trata com maestria é o fato de que não se pode preservar apenas a floresta; para que ela exista é necessário assegurar que os animais que nela habitam também sejam preservados, assim como o sistema hídrico e os minerais do solo que a sustentam. Tudo na Natureza está inter-relacionado e qualquer perturbação em cada uma de suas partes poderá causar sua destruição... este é um conceito essencial para a sustentabilidade!

Portanto, ainda que reconhecendo a importância da decisão, modesta e insuficiente, de Dilma Rousseff, e entendendo as poderosas forças que ela afrontou com sua deliberação, é necessário que se saiba que é muito pouco. É preciso lutar pelo Desmatamento Zero, preconizado pelo Greenpeace. Mais do que isso, é necessário compreender as complexas relações entre todos os biomas terrestres e resgatar o conceito de GAIA: a Terra como um organismo vivo, que precisa ser entendido, não através de suas partes componentes, mas sim por meio das complexas relações que mantêm o equilíbrio da vida no planeta.

Portanto, não é o caso de se comemorar resultados, mas de acautelar-se contra as forças do mal que dominam o Congresso Nacional e sua famigerada e desprezível Bancada Ruralista. Eles não se calarão, pois poderosos interesses sustentam essa minoria que sufoca a Nação: latifundiários, indústrias de agrotóxicos, mineradoras, madeireiras, banqueiros... como dizia aquela canção, na época da ditadura militar: "É preciso estar atento e forte: não temos tempo de temer a morte!"

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Estudo fornecerá base científica para prática da canoagem



Trabalho apoiado por Bolsa e Auxílio da FAPESP pode ajudar a melhorar desempenho da Seleção Brasileira de Canoagem Slalom nos Jogos Olímpicos de 2016 (divulgação)
Fonte: AGÊNCIA FAPESP - Por José Tadeu Arantes

Agência FAPESP – Quando se realizarem, em 2016, os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, os brasileiros talvez venham a se surpreender positivamente com o desempenho da Seleção Brasileira de Canoagem Slalom.
Caso se confirme, tal performance não será fruto do acaso, mas de sólidas bases científicas. É que parte dos atletas que agora integram a equipe brasileira dessa modalidade participou, recentemente, da pesquisa conduzida pelo estudante Leonardo Henrique Dalcheco Messias, sob a orientação da professora doutora Fúlvia de Barros Manchado Gobatto.
Apoiado com Bolsa da FAPESP, Messias obteve a primeira colocação na sessão oral do 4º Congresso de Iniciação Científica (CIC), promovido pela Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Estadual Paulista (Unesp).
O evento, realizado na Faculdade de Educação Física da Unicamp em setembro, trouxe ao público o conhecimento produzido por alunos de graduação e pós-graduação das três universidades estaduais paulistas, que se destacam no cenário nacional pela qualidade de suas produções no campo da educação física e dos esportes, em suas diversas modalidades.
Messias apresentou, na ocasião, o estudo "Análise de diferentes modelos matemáticos e combinações de esforços máximos, utilizando o modelo de velocidade crítica em canoagem slalom", resultante de dados parciais obtidos em projeto de iniciação científica.
O projeto se estendeu de janeiro a dezembro de 2011, período no qual Messias e Gobatto desenvolveram atividades de pesquisa na Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep).
Dentre os principais objetivos do estudo, destaca-se a aplicação de um modelo de avaliação das condições aeróbia e anaeróbia de atletas de alto rendimento na canoagem slalom, estudando os efeitos do treinamento esportivo sobre esses parâmetros, bem como suas relações com as respostas fisiológicas observadas em provas simuladas.
O estudo buscou reproduzir as condições reais das competições, empregando os mesmos gestos e equipamentos utilizados no esporte e realizando as avaliações nos locais onde habitualmente as equipes treinam, isto é, em lagoas e rios.
“Esses aspectos são fundamentais se considerada a possibilidade da tradução dos resultados científicos em orientações técnicas precisas, fornecendo aos preparadores informações para a prescrição de treinamentos adaptados às características individuais dos atletas”, disse Messias à Agência FAPESP.
“Protocolos de avaliação realizados em esteira rolante e cicloergômetro não expressam as condições reais dos esforços físicos efetuados em todas as modalidades esportivas. Nesse sentido, testes que respeitem a especificidade da modalidade precisam ser adotados”, disse Gobatto.
Segundo a orientadora, por conta das características da canoagem slalom, os atletas necessitam de condicionamento anaeróbio para suportar intensidades de exercício elevadas, quando remam contra a correnteza dos rios, e de condicionamento aeróbio, que pode ser estimado pela “velocidade crítica” durante a recuperação dos esforços nas provas e nas sessões de treinamento.
“Investigamos a aplicabilidade dos testes e os efeitos de oito semanas de treinamento, com intensidade e volume monitorados, sobre os parâmetros aeróbio e anaeróbio estimados pelo modelo de avaliação adotado”, disse Gobatto.
Atualmente, Gobatto integra o quadro de docentes do curso de Ciências do Esporte da Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp, em Limeira, atuando no Laboratório de Fisiologia Aplicada ao Esporte (Lafae).
Messias foi recentemente aprovado no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Nutrição e do Esporte e Metabolismo dessa mesma unidade da Unicamp.
Após a execução do projeto de iniciação científica, um projeto de pesquisa envolvendo avaliações das condições aeróbia e anaeróbia por testes livres e atados em canoagem slalom apresentado por Gobatto foi aprovado pela FAPESP e terá financiamento por meio da modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular.
“Por conta dos resultados positivos visualizados no estudo de iniciação científica, estabelecemos parceria com a Confederação Brasileira de Canoagem. E, a partir de agora, efetuaremos nossas pesquisas com os atletas da seleção”, disse Messias.
O Laboratório de Fisiologia Aplicada ao Esporte (Lafae), instalado com apoio da FAPESP, é um dos mais bem equipados do interior paulista. 

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Relato emocionante de Manoel Morgado, na descida do Manaslu

07.10.2012 - 11:20 - Por: Manoel Morgado
Fonte: Portal Extremos


Queridos amigos

Em primeiro lugar gostaria de agradecer de coração a todos que acompanharam esta expedição que foi, sem dúvida, a mais dura que já fiz na vida, não só por ter de deparar com escolhas muito duras, por ver muito de perto como o montanhismo de grandes altitudes pode ser cruel, mas também fisicamente, já que nunca antes havia tentado escalar um 8000 sem apoio e sem oxigênio suplementar.

Através da Lisete [Florenzano] sabia das palavras de vocês me incentivando, me encorajando e, podem ter certeza, eu precisei de tudo isso, principalmente nas 72 horas que se seguiram à minha tentativa de cume, que foram dramáticas. Eu e o Paul chegamos ao campo 4, a 7450 metros, absolutamente exaustos. Uma coisa que descobri nesta expedição foi realmente surpreendente. A questão tão debatida de subir com ou sem oxigênio não é assim tão importante. Havia muita gente na montanha subindo sem. Mas, muito pouca gente tentando sem o apoio dos sherpas. Acho que, no fim, isso que deixa a escalada realmente difícil. Ficar um mês inteiro escalando, levando quilos e quilos de equipamento, comida, gás para os campos altos acaba te desgastando fisicamente e, quando chega o grande dia, você está acabado. Hoje sei que se tentar novamente um 8000 sem oxigênio suplementar tentarei com o auxílio dos sherpas. Sem ambos, é além de minhas forças.

Desde que havíamos chegado no campo 3 que o vento não parava, um vento fortíssimo que sacudia a barraca incessantemente e que nos minava psicologicamente. Montar e desmontar o acampamento (levamos a mesma barraca do 3 para o 4) foi uma luta. Por causa do vento havia uma parede muito inclinada de gelo azul. No dia anterior toda a equipe do Russel Brice havia feito cume, e agora seus sherpas desescalavam esta parede, deslocando inúmeros blocos de gelo. Estou me concentrando em colocar as pontas dos meus crampons no lugar certo no gelo escorregadio e a próxima coisa que sei é que estou deitado no gelo, por sorte preso pelo jumar na corda fixa, e completamente tonto. Um bloco de gelo havia batido na minha cabeça! Não está sangrando e, aparentemente, nada de mais sério aconteceu, mas fico muito assustado, não sei o que fazer. Se descer, é o fim da expedição; se subir e começar a piorar, é normal em traumas cranianos não acontecer nada imediatamente, mas depois a pessoa piora. Tenho à frente a mais técnica parte da escalada entre o o 3 e o 4. Descanso meia hora e, como a dor vai melhorar, resolvo continuar. Mais uma decisão difícil nesta montanha, que está se revelando muito, mas muito mais difícil do que esperava. Todos dizem que o Cho Oyu e o Manaslu se equivalem, mas discordo radicalmente. O Manaslu é uma montanha muito mais perigosa e difícil tecnicamente do que o Cho Oyu.

O Paul chega ao campo 4 hipotérmico: o esforço da escalada com peso esgotou suas reservas. Montamos o acampamento o mais rapidamente que o vento permite; o Paul entra em seu sleeping bag e eu aqueço água para ele. Sabemos que não teremos forças para escalar na madrugada seguinte. Ficar mais 24 horas a esta altitude não é recomendável, você só se desgasta, só anda para trás, mas não temos alternativa. Tentamos comer, mas o apetite simplesmente desapareceu e olhamos com revolta para a comida que temos. Passamos o dia tentando nos hidratar e, à meia noite, começamos a nos preparar para o ataque ao cume. O vento está ainda mais forte e sair do frágil abrigo da barraca é muito difícil. O dia de cume é o mais fácil tecnicamente de toda a escalada. Uma longa rampa até o cume final. Para chegar lá é só colocar um pé em frente ao outro, mas após uma hora eu sei que nem isso serei capaz de fazer. Cheguei ao final de minhas forças. Se prosseguir sei que não terei forças de voltar. Assim se morre em montanhas de 8.000. Você segue, segue, até as forças se acabarem sem considerar que descer nestas altitudes é quase tão desgastante quanto subir. Daí você senta e dorme para sempre. O frio está muito intenso. Na velocidade absurdamente lenta que estou não produzo calor algum e meus dedos reclamam. Depois de insistir em continuar a escalada após a avalanche, após a longa semana de mau tempo, após a pancada do bloco de gelo na cabeça, sei que finalmente não há como seguir. Cheguei no final. Se quero viver tenho de voltar para a barraca. Olho para trás e ela está logo ali, não subi quase nada. Paul resolve seguir, mas sei que ele também não chegará muito longe.

Nossa volta ao campo 2 neste mesmo dia é uma epopeia. A cada 10 metros verticais temos de parar e descansar. O que normalmente levaríamos 3 horas, levamos 8. Parecemos dois zumbis fazendo um esforço imenso para colocar um pé na frente do outro. Nas partes técnicas temos de fazer um esforço imenso para não cair montanha abaixo. Rapelamos mesmo nas encostas mais suaves para garantir que não faremos nenhuma besteira. Ao chegarmos no campo 2, quase à noite, respiramos aliviados. Depois de uma noite de descanso seguramente estaremos melhor. Mas a exaustão é tão grande que não conseguimos comer. Isto é muito estranho; sabemos que fizemos um esforço imenso, sabemos que precisamos e no entanto não conseguimos, simplesmente não conseguimos.

Neva forte a noite toda. Pela manhã não se vê nada. As trilhas estão cobertas, as cordas fixas soterradas pela neve, a visibilidade de não mais do que 5 metros. Saímos da barraca com neve até o joelho. O Paul que está mais forte vai abrindo trilha afundando às vezes até a virilha. Sei que como estamos não chegaremos no campo 1. Estamos fracos, não há mais ninguém na montanha; apenas Victor, um colombiano no campo 2. Seguimos pelas cordas quando encontramos, por instinto, quando não. As cravasses, que sempre foram enormes, agora estão monstruosas. Ficamos olhando para suas profundezas e, sem ter nada mais o que fazer, saltamos, sabendo que se um cair será o fim. Uma está tão grande que temos de fazer um sistema de tirolesa com as mochilas. Com elas nas costas não haveria chance de saltar. A cada uma delas me despeço da vida e só salto porque realmente não há o que fazer. A escada está novamente menor do que a cravasse e fica lá balançando, presa somente por cordas. Em um momento dramático, o Paul prende os dentes dos crampons nos degraus da escada e não consegue soltar, fica lá precariamente equilibrado tentando soltar a bota. Estamos com mochilas monstruosas, com tudo do acampamento 4 e do 2.

Chegamos ao campo 1 após horas de desespero, e meu coração se enche de alegria; o Milton está lá nos esperando para ajudar-nos na última etapa, rumo à segurança. Saímos às 16 horas, sabendo que chegaremos à noite; mas a ideia de passar outra noite na montanha é impensável. Mesmo neste trecho as cravasses estão enormes e mais uma vez temos de saltá-las. Todas essas, se fosse no Everest, estariam com escadas… O Rinji, meu amigo sherpa, que é nosso base camp manager, envia um amigo seu para ajudar-nos, e ele nos encontra no meio do caminho do 1 para o base, e toma minha mochila. Mesmo assim, meu ritmo é desanimadoramente lento. Está nevando muito, não parou desde de noite. Na luz da minha head lamp só vejo a área do foco dela. Ao redor tudo se mistura. Meus lábios são duas úlceras muito sensíveis e, a cada segundo, uma bolinha de neve, dura como gelo, atinge causando uma dor lancinante. Cubro-me com o casaco, mas não consigo respirar. De repente, o sherpa desaparece dentro de uma cravasse, nosso último obstáculo para a segurança. Meu coração pára de bater. Ele está sem crampons (sherpas raramente usam entre o o base e o 1, e não está clipado na corda fixa; eles fazem tantas vezes este caminho que se sentem imunes à gravidade). Esta cravasse, era até 3 dias atrás, razoavelmente pequena, mas a ponte desabou e agora é bastante larga, com um pilar no centro, mais abaixo que as bordas, muito instável. Lá está ele, tentando subir a cavalo no pilar. Eu e o Paul simplesmente vemos, sem fazer nada. O Milton reage e vai tentar ajudar, mas ele já está conseguindo escalar de volta com suas botas sem crampons.

Às oito da noite desabo dentro da barraca-refeitório, aquecida e iluminada. Ofegante, não acredito que estou a salvo. Quantas vezes durante estas 60 horas achei que não chegaria…

No dia seguinte descemos para Sama Gaon e, 24 horas depois, estou em Katmandu após um dos vôos de helicóptero mais espetaculares do planeta. A estreita garganta que percorremos por 7 dias para chegar ao campo base de cima parece uma serpente prateada, refletindo os raios de sol de um dia lindíssimo. Como pode tanta beleza conviver com tanto sofrimento? Do conforto da cabine do helicóptero olho para o Manaslu e tento me imaginar lá no meio da nevasca, do frio, do desespero. Mas, daqui, o que vejo, são seus dois picos, brilhando inocentes à luz da manhã. Torço pelo Victor, o colombiano que deixamos no campo 2, confiante em seus planos para o cume.

Resta a pergunta: valeu a pena? Sim, sem dúvidas. Fui para o Manaslu não para fazer cume e sim para descobrir se conseguiria fazer cume, para achar meus limites. Todo esporte busca superação e montanhismo também. Depois do Cho Oyu e do Everest com apoio de sherpas e oxigênio suplementar queria saber o que conseguiria fazer. Acho que descobri. Claro que vou continuar escalando, e claro que vou continuar escalando 8000´s; isto tudo é minha vida, minha paixão e minha profissão! Mas, sei hoje até onde posso ir. No próximo ano: Cho Oyu, McKinley e Ama Dablan !!!!

Muito obrigado pela torcida!
Grande abraço a todos!
Manoel Morgado

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

O agronegócio brasileiro na década 2009-2019

Fonte: ANDEF - Associação Nacional de Defesa Vegetal


O agronegócio brasileiro tem grande potencial de crescimento. O mercado interno é expressivo para todos os produtos analisados, e o mercado internacional tem apresentado acentuado crescimento do consumo. Este é o resultado do estudo Projeções do Agronegócio - 2008/09 a 2018/19, elaborado pela Assessoria de Gestão Estratégica do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). A seguir, o resumo do estudo:

Recursos naturais

Países superpopulosos terão dificuldades de atender às demandas devido ao esgotamento de suas áreas agricultáveis. As dificuldades de reposição de estoques mundiais; o acentuado aumento do consumo, especialmente de grãos como milho, soja e trigo; o processo de urbanização em curso no mundo, criam condições favoráveis aos países como o Brasil, que têm imenso potencial de produção e tecnologia disponível. A disponibilidade de recursos naturais no Brasil é fator de competitividade.

Principais produtos

Os produtos mais dinâmicos do agronegócio brasileiro deverão ser a soja, milho, trigo, carnes, etanol, farelo de soja, óleo de soja e leite. Esses produtos indicam elevado potencial de crescimento para os próximos anos.

A produção de grãos (soja, milho, trigo, arroz e feijão) deverá passar de 139,7 milhões de toneladas em 2007/08 para 180 milhões em 2018/19. Isso indica um acréscimo de 40 milhões de toneladas à produção atual do Brasil. A produção de carnes (bovina, suína e aves) deverá aumentar em 12,6 milhões de toneladas. Isso representa um acréscimo de 51% em relação à produção de carnes de 2008. Três outros produtos com elevado crescimento previsto, são açúcar, mais 14,5 milhões de toneladas, o etanol, 37 bilhões de litros, e o leite, 9 bilhões de litros.

Tecnologia e produtividade

O crescimento da produção agrícola deve dar–se com base na produtividade, impulsionado pelo uso de tecnologias e manejos recomendados pela pesquisa. Deverá ser mantido forte crescimento da produtividade total dos fatores como trabalhos recentes têm mostrado. Os resultados revelam maior acréscimo da produção agropecuária que os acréscimos de área.

As previsões realizadas até 2018/19 são de que a área de soja deve crescer 5,2 milhões de hectares em relação a 2007/08; a área de milho, 1,75 milhão de hectares; a área de cana deve crescer 6 milhões de hectares; as áreas de arroz e trigo devem aumentar e o café deve sofrer redução de área. No total das lavouras analisadas, o Brasil deverá ter um acréscimo de área da ordem de 15,5 milhões de hectares nos próximos anos.

O Brasil e o mercado mundial

Haverá expressiva mudança de posição do Brasil no mercado mundial. A relação entre exportações brasileiras e o comércio mundial mostra que em 2018/19, as exportações de carne bovina brasileira representarão 60,6% do comércio mundial; a carne suína, representará 21% do comércio, e a carne de frango deverá representar 89,7% do comércio mundial. Esses resultados indicam que o Brasil continuará a manter sua posição de primeiro exportador mundial de carne bovina e de carne de frango.

Apesar de o Brasil apresentar nos próximos anos forte aumento das exportações, o mercado interno será um forte fator de crescimento. Do aumento previsto nos próximos onze anos na produção de soja e milho, 52% deverão ser destinados ao consumo interno, distribuídos da seguinte forma: 57,9% do aumento da produção de milho devem ir para o mercado interno em 2018/19, e 44,9% do aumento da produção de soja deverá ir para o consumo interno. Haverá, assim, uma dupla pressão sobre o aumento da produção nacional, o crescimento do mercado interno e as exportações do país. 

Nas carnes, também haverá forte pressão do mercado interno. Do aumento previsto na produção de carnes, de 12,6 milhões de toneladas, entre 2007/08 e 2018/19, 50,0% deverão ser destinados ao consumo interno e o restante dirigido às exportações.


Também com relação a outros produtos o Brasil deve melhorar sua posição no comércio mundial, dada pela relação entre quantidade de exportação e comércio mundial. Para a soja, essa relação deverá passar de 36%, em 2008, para 40%, em 2018/19; para o óleo de soja, de 63% para 73,5%; para o milho, de 13% para 21,4%, e para o açúcar, de 58,4% para 74,3%.


Incertezas

As principais incertezas no cenário nessa década, segundo o estudo do MAPA, são: aumento do grau de protecionismo nos países importadores; recessão mundial; e mudanças climáticas severas.

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Minhas Considerações

Apesar de declarar as incertezas relacionadas com "mudanças climáticas severas", o MAPA, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento não demonstra nenhum pudor em fazer tais projeções catastróficas para os ecossistemas brasileiros. Ou será que a expansão das fronteiras agrícolas projetadas em 15,5 milhões de hectares (155.000 km²) e equivalentes a  mais do que o tamanho da Inglaterra (130.000 km²) não será também decorrência do desmatamento e da devastação da Amazônia e do Cerrado brasileiros?

Atentem para os valores de participação atual do Brasil no mercado mundial de soja e gado: 50% para exportação e 50% para o mercado interno! Considere-se que 50% da soja produzida deve ser utilizada para produção de ração animal para o gado! E são cerca de 200 milhões de cabeças de gado, um boi para cada brasileiro, ruminando, produzindo gás metano e pisoteando a terra até esgotar nascentes e veredas de nossas áreas, antes verdadeiros santuários da vida selvagem, e hoje apenas pasto e intermináveis monoculturas... futuros desertos sem nenhuma serventia, seja para a agropecuária, seja para a Natureza.

É evidente que estamos destruindo nossas maiores riquezas e comprometendo o futuro de nosso próprio povo para optar por um modelo econômico de produção predatório e de funestas consequências futuras! O próprio Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento sabe e declara que teremos "mudanças climáticas severas"! De onde provêm essas mudanças climáticas, senão da perda de áreas florestais, da redução dos volumes de água doce dos rios e de seus afluentes, da alteração drástica no ciclo das águas na Natureza? Será que esse sistema de produção predatório nos assegurará um lugar dentre as economias mais avançadas do mundo? E o que fazemos da alta tecnologia, da produção intelectual que levou Estados Unidos, Japão e Alemanha à situação de nações mais evoluídas do mundo? Relegamos o conhecimento intelectual a segundo plano, ignorando o óbvio: que apenas isso nos diferencia dos animais ditos "irracionais"! Será que essa irracionalidade não nos aproxima do destino daqueles que hoje destruímos?

É evidente que estamos nos iludindo e enganando nosso povo, pois além de tudo esse modelo econômico de produção enriquece apenas uma minoria de latifundiários, com baixíssima utilização de mão de obra, ou seja, de geração de empregos, e nenhuma distribuição de riquezas. Se esse minúsculo grupo de latifundiários domina a política nacional através da famigerada, arrogante e desgraçada Bancada Ruralista é porque o povo vota nesses "representantes" desqualificados e dá um tiro no próprio pé!

Não existe futuro para a humanidade e para a nossa Nação com este modelo elitista de produção e de consumo, que privilegia uns poucos e "escraviza" a grande maioria da população, induzindo-a a comprar e consumir o que não precisa, intimidando a população a não poupar para garantir os índices de "desenvolvimento" e do PIB Nacional em detrimento de suas próprias vidas! Hoje, o grande sonho de consumo dos brasileiros (acalentado e incentivado pelo próprio governo federal, através de incentivo publicitário e de renúncia fiscal) é trocar de automóvel todos os anos, comprometendo ainda mais o já precário sistema viário brasileiro, e onerando o Meio Ambiente com um consumo desproporcional de combustíveis fósseis, em vez de buscar novas fontes alternativas de energia renovável e limpa!

Estamos destruindo, em ritmo acelerado, nossos recursos naturais, apenas para prover o mercado mundial das matérias primas necessárias às indústrias de alta tecnologia que não temos aqui, criando uma subserviência devastadora para os brasileiros: seremos eternamente tratados como nação de segunda categoria, provedora de carne de gado, soja, minérios, madeira... tudo arrancado da Natureza, através de um processo perverso de destruição de florestas, rios, matas de galeria e de imensas montanhas que são transformadas em matéria-prima para os países de primeiro mundo, dos quais nunca faremos parte!

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

A vida e a obra de Eric J. Hobsbawm, pelo historiador Elias Thomé Saliba

"Com a morte de Hobsbawm desaparece um dos mais brilhantes historiadores de nossa época e talvez o último da primeira geração de marxistas''


Roland Schlager/EFE
“O perfil do bom historiador não pode se parecer nem com o carvalho e nem com o cedro, por mais majestosos que sejam, e sim com um pássaro migratório, igualmente à vontade no ártico e no trópico - e que sobrevoa ao menos a metade do mundo.” Ao escrever isto em 2002, Eric J. Hobsbawm talvez estivesse descrevendo sua própria trajetória. Nascido em Alexandria em 1917, de família judaica - pai do East End londrino e mãe da Áustria dos Habsburgos - passou a infância em Viena, tornou-se órfão aos 14 anos e foi morar em Berlim com uma tia, entrando para o Partido Comunista alemão (KPD) ainda no fim do curso ginasial. Após a ascensão de Hitler mudou-se para Londres onde concluiu os estudos secundários. Em 1936, na febre da Front Populaire em Paris, perambulou na carroceria de um caminhão do cinejornal do Partido Socialista; depois cruzou a fronteira para a Catalunha, logo no início da Guerra Civil Espanhola.

No mesmo ano, conseguiu uma bolsa para estudar história no King’ s College, em Cambridge. Nos anos da 2ª. Guerra integrou a divisão do exército britânico que cavava trincheiras, atuando ainda como tradutor no setor de inteligência militar. Quando concluiu seus estudos, pagou o aluguel da casa escrevendo uma coluna semanal sobre jazz no New Statesman - com o pseudônimo de Francis Newton (textos depois reunidos no livro História Social do Jazz). Em 1962, em sua segunda visita à Cuba, serviu até de tradutor para Che Guevara e o restante da delegação britânica. Quando se aposentou, após anos de docência, recebeu inúmeros títulos honoríficos e tornou-se Companion of Honor da rainha da Inglaterra.

“Não se podia ensinar nada a ele, seria impossível. Eric já sabia de tudo” Assim resumiu Christopher Morris, orientador de estudos em Cambridge, quando perguntado a respeito do jovem Hobsbawm: daí começou a carreira ininterrupta de um historiador instintivamente poliglota e cosmopolita em todas as suas referências e um dos raros representantes de uma geração que teve o privilégio de ser, ao mesmo tempo, testemunha e intérprete dos últimos noventa anos da história mundial.

Nas décadas de 1930/1940, quando Hobsbawm se formou, a Inglaterra era o único país onde surgiu uma escola de historiadores marxistas. Talvez porque no rol curricular das universidades inglesas, a literatura havia tomado o espaço vazio deixado pela filosofia. É que a geração de Hobsbawm - representada por nomes notáveis como Christopher Hill, Edward Thompson e Raymond Williams - adentrou a oficina da história através da paixão pela literatura. O extremo rigor da pesquisa também marcou a obra historiográfica desta geração new left, que se formou no auge do clima ideológico de suspeita da Guerra Fria. Certamente veio da paixão pela literatura o amplo domínio que estes historiadores tinham da escrita e o motivo pelo qual Hobsbawm tenha se tornado um autentico mestre da prosa inglesa: sem teorizações intrincadas e nenhum traço de narcisismo autocomplacente, ele é dono de um estilo claro, conciso, sem afetações, equilibrando - em doses exatas - distanciamento e engajamento crítico.

Fui “um antiespecialista em um mundo de especialistas, um intelectual cujas convicções políticas e obra acadêmica foram dedicadas aos não-intelectuais”, escreveu em Tempos Interessantes - livro que, até hoje virou um paradigma de como deveriam ser escritas todas as autobiografias. Apesar do seu precoce - e nunca explicitamente abandonado - engajamento comunista, sempre assumiu um olhar historiográfico desenraizado e pouco afetivo. Definia-se como “um historiador pertencente a minorias atípicas, imigrante na Grã-Bretanha, inglês entre centro-europeus e judeu em toda parte - sentindo-se anômalo até entre os comunistas”, reconhecendo-se apenas na frase definidora que E. M. Forster utilizava para definir um poeta: “ele ficava num ângulo ligeiramente oblíquo em relação ao universo.”

O que também o tornou um pesquisador suscetível a uma versatilidade incomum. Das rebeldias primitivas ao banditismo social, das rebeliões de trabalhadores pobres ao significado do feriado do primeiro de maio, da máfia aos luddistas e às tradições inventadas -, Hobsbawm escreveu sobre os mais diversos temas, revelando insuspeito domínio dos fatos e surpreendentes interpretações. Sua panorâmica história do “triunfo e transformação do capitalismo”, que começa com a dupla revolução - a 1ª. Revolução Industrial inglesa e a Revolução Francesa - e termina com a queda dos regimes comunistas na década de 1990-, tornou-o mundialmente famoso. Traduzido em centenas de países, estes quatro livros - abrangendo o período da era das revoluções até o breve século 20 - tornaram-se parte da bagagem obrigatória não apenas dos estudantes de humanidades, mas de um público bem mais amplo.

Hobsbawm sempre tinha algo importante a dizer e seus posicionamentos foram sempre críticos. Quando caiu o muro de Berlim, muitos apressadinhos anunciaram e apegaram-se à desacreditada ideia do “fim da história”. Francis Fukuyama retocou a maquiagem de um antigo livro de Alexandre Kojève sobre Hegel e colocou em circulação esse diagnóstico vistoso, mas pouquíssimo convincente - que foi solenemente abandonado depois dos eventos tristemente célebres de setembro de 2001. Hobsbawm chegou a dizer que até acreditava no “fim da história” - mas, num sentido bem diferente: é o fim da história tal como a conhecemos nos últimos 10 mil anos, isto é, desde a invenção da agricultura sedentária. Isto porque, nos primeiros anos do terceiro milênio, as mudanças estão se acelerando num ritmo estonteante, quase impossível de se acompanhar com os olhos, os conceitos - e até com as próprias palavras - que dispúnhamos para compreender o século 20.

Era sempre difícil para um historiador de formação marxista reconhecer, mas o autor de A Era Dos Extremos não acreditava em saltos ou mudanças radicais no capitalismo. Nem por isto deixava de assumir uma posição impiedosamente crítica em relação à história mundial. A globalização trouxe consigo uma dramática acentuação das desigualdades econômicas e sociais, tanto no interior das nações quanto entre elas próprias. Embora a escala real da globalização permaneça modesta, seu impacto político e cultural é desproporcionalmente grande e muito mais sensível para os que menos se beneficiam dela. Por outro lado, nos seus últimos escritos e entrevistas Hobsbawm deixava bastante claro como estávamos enfrentando os problemas do século 21 com um pífio conjunto de mecanismos políticos, flagrantemente inadequados para resolvê-los. Sua defesa dos valores iluministas era intransigente: acreditava que eles constituíam os únicos alicerces que temos para construir sociedades justas, seja qual for o lugar da terra e para todos os seres humanos. “Quando as pessoas não têm mais eixos de futuros sociais acabam fazendo coisas indescritíveis”, escreveu no ensaio “Barbárie: manual do usuário”.

Ele próprio, apesar de “pássaro migratório”, como historiador nunca perdeu seu eixo, que sempre foi o marxismo. Suas convicções politicas incluíam a hostilidade a toda forma de imperialismo, tanto das grandes potências que afirmam “estar fazendo um favor às suas vítimas ao conquistá-los, quanto a o do homem branco que pressupõe, para si próprio e para os arranjos que faz, uma superioridade automática sobre as pessoas cuja pele tem outra cor.” Mas seu tom só se elevava um pouco, quando confrontado com as lúgubres perversidades da era estalinista. O episódio da violenta intervenção soviética na Revolução Húngara em 1956 é um exemplo marcante. Certa vez, quando Arthur Koestler, - irritado e em alto estado etílico numa tarde emotiva num bar austríaco - cobrou-lhe a ausência de posicionamento, Hobsbawm deu-lhe um xeque mate, mostrando-lhe uma carta coletiva na qual havia denunciado todas as atrocidades. Mais recentemente, o historiador Tony Judt disse que Hobsbawm era admirável em sua fidelidade ao comunismo, mas alfinetou: “para fazer algum bem no novo século, devemos começar dizendo a verdade sobre o antigo e um historiador do seu quilate não poderia mais se recusar a encarar o demônio e chamá-lo pelo nome: o estalinismo e todos os seus crimes hediondos”. Hobsbawm respondeu que as críticas de Judt eram improcedentes, pois em A Era Dos Extremos encarava o problema, criticando-o e firmando sua posição. Retrucou ainda que condenava “aqueles intelectuais anticomunistas que hoje têm apenas uma bandeira única, a de serem exclusivamente anticomunistas, esquecendo-se completamente das ideais pelas quais lutavam.” “Judt deseja apenas que eu diga que estava errado - e não vou satisfazê-lo”, finalizou Hobsbawm. A polêmica não rendeu, parando nestas tantas cutiladas curtas, até porque logo depois Judt cairia doente e morreria. É pena. Pois o debate poderia se alongar, ao refletir sobre o imenso abismo ético que se abriu entre os intelectuais europeus do “leste” e os “ocidentais” em função da própria história e da experiência de cada um com o comunismo. Abismo que se mantém até hoje.

Perscrutador incansável do seu século, Hobsbawm deixou uma obra que é uma aula magistral de história contemporânea. Ele sabia ainda, quando necessário, provocar o leitor com tiradas irônicas. Seu relato dos estertores da democracia alemã, no fim da República de Weimar, é resumido numa única frase: “Estávamos no Titanic, e todos sabiam que ele estava batendo no iceberg”. Ao discorrer sobre os movimentos estudantis dos anos 1960, ele chegava a argumentar que “a marca distintiva realmente importante na história da segunda metade do século XX não é a ideologia nem as ocupações estudantis, e sim o avanço do jeans”. E, finalmente, ao refletir sobre o poder em geral, sintetiza-o simplesmente pela megalomania, que ele define como “a doença ocupacional dos países e dos governantes que creem que seu poder e seu êxito não têm limites.”

Um humorista inglês brincou, certa vez, definindo a escola de historiadores marxistas de Hobsbawm como os “cavaleiros da távola redonda em busca do perdido Graal”. Com a morte de Hobsbawm desaparece um dos mais brilhantes historiadores de nossa época e talvez o último daquela primeira geração de marxistas, para os quais a Revolução de Outubro - uma espécie de Graal - era o ponto de referência central no horizonte político. Marca também o desaparecimento de um dos últimos historiadores que colaram de tal forma sua trajetória de vida com a história pública, que elas parecem indistinguíveis. “O sonho da Revolução de Outubro ainda está em algum lugar dentro de mim, assim como um texto apagado no computador lá permanece, à espera dos técnicos que o recuperem dos discos rígidos”, confessou Hobsbawm. E em lacônica resposta à tirada humorística, concluiu: “Porque se desistirmos do Graal, desistiremos de nós mesmos.”

ELIAS THOMÉ SALIBA É PROFESSOR DE TEORIA DA HISTÓRIA NA USP E AUTOR DE, ENTRE OUTROS, RAÍZES DO RISO (COMPANHIA DAS LETRAS)


FONTE: O ESTADO DE SÃO PAULO

Morre aos 95 anos, em Londres, o historiador Eric Hobsbawm

Segundo a família, ele morreu em um hospital da capital britânica após enfrentar uma longa doença
Roland Schlager/Efe
LONDRES - Morreu nesta segunda-feira, 1, aos 95 anos, Eric Hobsbawm, considerado um dos maiores historiadores do século 20. O jornal britânico Guardian disse que a família confirmou que Hobsbawn sofria longamente de pneumonia.

Segundo a filha do escritor marxista, Julia Hobsbawm, ele morreu no começo da manhã de segunda no hospital Royal Free de Londres, onde estava internado, disse a Efe. Entre suas obras mais importantes estão "História do século 20, 1914-1991" e "Guerra e paz no século 21".

É dele também a série composta pelos livros "A era das revoluções", "A era do capital", "A era dos impérios" e "Era dos extremos". Seu último livro, "Como mudar o mundo", uma coleção de ensaios, foi publicado no ano passado 2011.

A vivência de Hobsbawm como aluno durante a década de 1930 na Alemanha ajudou a consolidar suas visões de esquerda. Em 1936, na Inglaterra, ele entrou para o Partido Comunista, do qual foi integrante durante décadas, apesar de ter se desiludido com a União Soviética.

Hobsbawm publicou o primeiro de três livros cobrindo o "longo século 19" em 1962, em que abrange o período 1789-1914. No segundo volume, "Era dos extremos", tratou do período até 1991. Hobsbawn nasceu na Alexandria, no Egito, em 1917, filho de pais judeus. Ele cresceu em Viena e em Berlim, mudando-se para Londres em 1933, mesmo ano em que Adolf Hitler chegou ao poder na Alemanha. O historiador deixa a mulher, três filhos, sete netos e um bisneto.

Pesquisa coleta dados sobre emissões de queimadas na Amazônia

Agência FAPESP – Para entender como as emissões de queimadas na Amazônia estão alterando o clima local e de todo o planeta, um grupo de pesquisadores brasileiros e britânicos tem sobrevoado a região desde o dia 12 de setembro.

Com o auxílio de equipamentos de ponta, os cientistas coletam dados sobre a composição química e as propriedades físicas da fumaça emitida. Verificam ainda de que forma os gases e as partículas sólidas lançados no ar modificam a composição das nuvens, alteram a química da atmosfera e interagem com a radiação solar.

“Foram realizadas 35 horas de voo até o momento. Nossa meta é chegar entre 60 e 70 horas até 5 de outubro, quando termina a fase de coleta de dados”, disse Paulo Artaxo, professor da Universidade de São Paulo (USP) e um dos coordenadores do projeto South American Biomass Burning Analysis (SAMBBA).

O SAMBBA, resultado de uma parceria entre a USP, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a Universidade de Manchester, no Reino Unido, e o serviço meteorológico britânico, conhecido como UK-Met-Office, foi destaque esta semana na sessão de notícias do site da revista Nature.

¬A iniciativa conta com apoio do Natural Environment Research Council (Nerc), da Inglaterra, que ajudou a financiar a aeronave. Os equipamentos usados na coleta de dados foram cedidos por diversas universidades britânicas.

No Brasil, os experimentos estão sendo financiados pela FAPESP, por meio de dois projetos de Auxílio à Pesquisa – Regular, um coordenado por Artaxo e outro por Karla Longo, do Inpe.

“O projeto teve origem em uma cooperação já existente há vários anos entre Inpe e UK-Met-Office para o desenvolvimento de modelos de previsão climática”, contou Longo.

Tanto os pesquisadores britânicos como os brasileiros, acrescentou Longo, sentiam a necessidade de melhorar a previsibilidade dos modelos para a região amazônica. “Ainda não é bem conhecido o impacto das queimadas na previsão do clima”, disse.

Ben Johnson, do Met Office do Reino Unido, destaca que a Amazônia está entre as quatro maiores regiões do globo em termos de queima de biomassa. “Realizamos experimentos semelhantes em países como Canadá e África do Sul. As previsões de nosso serviço de meteorologia abrangem todo o globo e esperamos, com esses dados da América do Sul, melhorar a qualidade das previsões”, disse à Agência FAPESP.

Planejamento

Uma grande equipe de cientistas participa do planejamento das missões de coleta de dados, que abrangem a maior parte da Bacia Amazônica, contou Artaxo.

Para isso, são analisados dados de satélites, projeções feitas pelos modelos climáticos já existentes e informações da Aerosol Robotic Network (Aeronet) – uma rede que, em parceria da USP com a Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, faz medições frequentes da coluna de aerossóis, as partículas sólidas da fumaça, sobre a Amazônia.

“Combinamos todas essas informações para decidir aonde voar e que tipo de voo fazer. Podemos fazer medições a 150 metros de altitude, para analisar as propriedades da fumaça recentemente emitida, ou a 12 quilômetros de altitude, para ver as alterações físico-químicas sofridas pela fumaça envelhecida e transportada pela convecção”, explicou Artaxo.

O avião de pesquisa, um grande jato de quatro motores, é equipado com instrumentos como espectrômetros de massa, monitores de ozônio, gases de efeito estufa e fotômetros de absorção e espalhamento de luz. Há também o equipamento Lidar, um laser que mede a distribuição vertical de partículas de aerossóis a cada segundo.

“Os equipamentos conseguem fazer medidas extremamente precisas e em alta resolução temporal. No caso dos gases de efeito estufa (CO2, CH4, N2O), por exemplo, a margem de incerteza é de 0,1%”, disse Artaxo.

Segundo o pesquisador, estão sendo analisadas tanto as emissões resultantes do desmatamento quanto as relacionadas à prática de queimadas da agricultura e de manutenção de pastos.

“Embora esses dois tipos de queimadas se concentrem em regiões diferentes da Amazônia – desmatamento ao norte, na região do norte do Mato Grosso, e agricultura mais próximo da fronteira com o Cerrado –, as emissões estão relativamente perto e se misturam na atmosfera”, disse.

Um dos objetivos do estudo é avaliar a diferença entre esses dois tipos de emissões e a contribuição de cada um deles para o efeito estufa e as mudanças climáticas na região. “Medimos a quantidade de sulfato, de nitrato e de material orgânico na fumaça em tempo real. Também analisamos as propriedades físicas das partículas sólidas, como tamanho desde 10 nanômetros e os coeficientes de absorção e de espalhamento de radiação. Tudo isso está relacionado com o impacto das emissões sobre o clima e o balanço radiativo terrestre”, disse Artaxo.

O grupo também mede as concentrações de monóxido de carbono, de ozônio, de óxidos de nitrogênio e de compostos orgânicos voláteis. “Existe uma enorme gama de compostos orgânicos voláteis e muitos deles nunca foram medidos em queimadas no Brasil”, afirmou.

Após o término da coleta de dados, terá início o processo de análise da grande quantidade de informações e de aprimoramento dos modelos climáticos que, segundo os cientistas, deve durar cerca de quatro anos.

“Modelos climáticos são representações numéricas dos processos químicos e físicos que acontecem na atmosfera. É necessário, portanto, conhecer bem os fenômenos para construir um conjunto de equações que os representem de forma precisa”, destacou Longo.

Também participam da coordenação do SAMMBA os pesquisadores Hugh Coe e Saulo Freitas, da Universidade de Manchester e Inpe, respectivamente.