Desde 2006, o Greenpeace celebra a assinatura e a renovação anual de um acordo com os produtores rurais, que se comprometeram em não comercializar soja produzida em áreas desmatadas. Aparentemente, um bom acordo para os ambientalistas, não fosse o fato óbvio que todas as lavouras de soja do Cerrado e da Amazônia foram plantadas em áreas que foram devastadas há menos de 50 anos...
Vegetação ciliar às margens do Rio Negro, AM |
Os ruralistas declararam, este ano, que seria a última renovação do acordo que, a partir de 2015, seria substituído por um novo compromisso, tomando por base o novo Código Florestal, e os instrumentos criados para o Cadastro Ambiental Rural. Com isto, os ruralistas estariam "legalizando" as inovações que eles mesmos propuseram para a "Gestão Ambiental" e para a "Sustentabilidade Agropecuária", nos moldes do novo código florestal.
Em tese, essas propostas viriam de encontro às reivindicações ambientalistas, e permitiriam que eles continuassem a ter acesso ao farto crédito rural, tomando empréstimos a juros subsidiados, como sempre fizeram, assegurando, a um setor sempre endividado, as benesses e generosidades do poder público e dos bancos oficiais de fomento (Banco do Brasil, Caixa Econômia, BNDES). Quantas moratórias a esses empréstimos foram concedidas nos últimos 50 anos? Quantos "perdões" ou parcelamento de dívidas tributárias foram concedidas aos latifundiários?
Em tese, essas propostas viriam de encontro às reivindicações ambientalistas, e permitiriam que eles continuassem a ter acesso ao farto crédito rural, tomando empréstimos a juros subsidiados, como sempre fizeram, assegurando, a um setor sempre endividado, as benesses e generosidades do poder público e dos bancos oficiais de fomento (Banco do Brasil, Caixa Econômia, BNDES). Quantas moratórias a esses empréstimos foram concedidas nos últimos 50 anos? Quantos "perdões" ou parcelamento de dívidas tributárias foram concedidas aos latifundiários?
Pois bem, vamos aos fatos históricos.
O avanço das fronteiras agrícolas sobre a Floresta Amazônica teve início durante a Ditadura Militar, mas suas origens históricas devem ser debitadas a Juscelino Kubitscheck, que pôs em prática as ideias de Getúlio Vargas, de transferir a capital federal para o Centro-Oeste brasileiro. Seu propósito era a "interiorização do desenvoolvimento". Os militares de 64 deram um cunho estratégico ("Segurança Nacional") a esse objetivo, alegando que a ocupação de nossos territórios da região norte seria imprescindível para a afirmação da Soberania Nacional perante a comunidade internacional, que já olhava com interesse as reservas de minérios e a riqueza biológica da Floresta Equatorial para a indústria farmacêutica.
Extração de madeira de Terra Indígena no Pará |
A ocupação da Amazônia se deu pela construção da rodovia Transamazônica, complementada por outras rodovias que cruzaram a floresta em todas as direções, criando extensa malha viária, que tornou possível a migração de povos de todas as regiões do Brasil para as áreas antes inóspitas da floresta, e abrindo novas fronteiras agrícolas para essas populações. Para estimular essa migração foram oferecidas terras da União, que se tornariam o embrião das novas cidades que se instalariam ao longo das rodovias. Gaúchos e nordestinos foram os "desbravadores" desses territórios, inicialmente destinados à agricultura e à pecuária de subsistência.
Hidrelétricas da Amazônia (instaladas e previstas) - clique na imagem para ampliar |
Essa estraordinária mobilização de povos e interesses trouxe consigo os graves problemas dos aglomerados urbanos (crimas, prostituição, bebidas, drogas), mas também a grilagem de terras, a pistolagem e os "coronéis" da política e da exploração dos recursos naturais, com gravíssimos e irreversíveis danos ao Meio Ambiente. Tudo isso aliado à corrupção nos bastidores de Brasília.
Queimada em meio à vegetação nativa: o 1º passo para a devastação. |
As grandes fazendas que se instalaram inicialmente em Mato Grosso e Goiás, logo estenderam seus domínios para o sul da Amazônia, concentrando-se, principalmente, em Rondônia, Pará e Tocantins. As fronteiras agrícolas se expandiam pela ação de madeireiras, seguidas pela pecuária e pelas grandes plantações de soja.
No período de transição da Ditadura para a nova Democracia o Brasil parou. Passamos por grave crise econômica, combatida por mirabolantes "planos econômicos" nos governos de Sarney e Collor, que levaram o país à estagnação por cerca de uma década. O Brasil herdava, dos militares, uma dívida externa de 100 bilhões de dólares, que foram captados para alimentar o assim chamado "milagre econômico" de Delfin Neto, baseado nas grandes obras de infraestrutura: estradas, pontes, hidrelétricas.
Situação da Transposição do rio São Francisco, dez anos depois de iniciada |
Resgatado o equilíbrio das contas públicas, graças à "Lei de Responsabilidade Fiscal" e à privatização das grandes estatais de energia, mineração e comunicações, promovidas por Fernando Henrique Cardoso, o país voltou a crescer e expandir sua Economia, principalmente devido ao Agronegócio e às gigantescas propriedades rurais da monocultura de soja, cana de açúcar, milho, algodão e à criação extensiva de gado. A mineração também deu sua contribuição, produzindo ferro, alumínio, manganês para exportação.
A Economia ia bem, mas o povo e o Meio Ambiente iam muito mal. O salário mínimo não ultrapassava a barreira dos cem dólares, a educação seguia, trôpega, pelas reformas promovidas pelo Acordo MEC-USAID dos tempos da Ditadura, e a mão de obra continuava despreparada para alavancar o crescimento industrial. Enquanto isso, os movimentos sociais bradavam "Reforma Agrária já!", através do MST e outras siglas campesinas.
Por do Sol na Floresta Amazônica |
Percebendo a fragilidade desse governo inexperiente e ávido pelo poder, forças reacionárias, vinculadas às oligarquias e ao latifúndio, se infiltraram no poder, tomando de assalto ministérios como o das Minas e Energia, da Agricultura e Pecuária, e do Trabalho, além de manter grande influência nas decisões políticas e econômicas, principalmente a partir da posse de Dilma Rousseff na Presidência da República. Empreiteiras, mineradoras, banqueiros e latifundiários passaram a frequentar o Palácio do Planalto com a desenvoltura de quem não só faz parte do poder, mas tem a primazia de decidir as questões fundamentais da política e da economia nacionais.
Garimpo em Terra Indígena do Pará, próximo a Belo Monte |
Se anos de debates ideológicos entre membros da Academia, Ambientalistas e ideólogos socialistas conseguiram produzir a Constituição Federal, o Código Florestal e os avanços da legislação indígena e quilombola, essas novas alianças do poder jogaram tudo por terra em pouco mais de uma década. Não apenas o Meio Ambiente está ameaçado, mas também o armistício entre trabalhadores e empresários, bem como as conquistas sociais, alcançadas a duras penas, desde o fim dos governos ditatoriais. Bancadas fundamentalistas de evangélicos e ruralistas tomaram o poder no Congresso Nacional, aprovando, em poucos anos, aberrações jurídicas que invalidaram décadas de luta pela Democracia e a Liberdade.
Políticos soterrados nas urnas e no julgamento popular, como Paulo Maluf, Renan Calheiros e José Sarney, foram resgatados pelo PT, transformando as casas legislativas em balcões de barganha e de interesses escusos e fascistas. Essa bancadas dominaram de tal forma o poder que já não sabemos quem governa o país: se o PT de Lula ou se o PMDB de Sarney. O fato é que o país caminha sem rumos, sem planos, sem comando central, deixando passar ao largo a mais espetacular oportunidade histórica de se alçar para níveis de desenvolvimento jamais imaginados, graças à grande crise econômica de 2008, que aniquilou as economias europeias e norte-americanas. A China, o México, o Chile, a Índia e outros países menores que o Brasil se agarraram a essa oportunidade e alavancaram suas economias, deixando o Brasil para trás.
Área alagada pela interrupção do curso de um igarapé |
A expansão agropecuária teve como consequência imediata a devastação de nossos principais biomas: o Cerrado e a Caatinga, que encolheram 50%, a Amazônia, que perdeu 25% de sua biomassa, e o Pantanal, que se encontra ameaçado pelo esgotamento de seus recursos hídricos, cujas nascentes se encontram, em grande parte, no Cerrado.
A agricultura e a pecuária seguem sua marcha de devastação, aliadas à mineração e à extração de madeiras, além da mais nefasta política de construção de hidrelétricas, com graves impactos às populações tradicionais indígenas e ao Meio Ambiente.
Nossa maior empresa pública, a Petrobrás, uma gigante do petróleo com áreas potenciais de prospecção, passou, nos governos petistas, a cumprir um papel de reguladora das taxas inflacionárias, mantendo preços deficitários, comprometendo os lucros de seus investidores e minando sua capacidade de investimentos, justo no momento em que foram descobertos poços gigantes de petróleo na plataforma marinha do litoral fluminense, conhecidos pela camada de pré-sal, a grandes profundidades. Uma intensa batalha política tomou conta do Congresso, em uma disputa pelos recursos de exploração do Pré-Sal, que já foram divididos entre os Estados da Federação antes mesmo que sua viabilidade técnica e econômica justificasse a euforia inicial.
A agricultura e a pecuária seguem sua marcha de devastação, aliadas à mineração e à extração de madeiras, além da mais nefasta política de construção de hidrelétricas, com graves impactos às populações tradicionais indígenas e ao Meio Ambiente.
Nossa maior empresa pública, a Petrobrás, uma gigante do petróleo com áreas potenciais de prospecção, passou, nos governos petistas, a cumprir um papel de reguladora das taxas inflacionárias, mantendo preços deficitários, comprometendo os lucros de seus investidores e minando sua capacidade de investimentos, justo no momento em que foram descobertos poços gigantes de petróleo na plataforma marinha do litoral fluminense, conhecidos pela camada de pré-sal, a grandes profundidades. Uma intensa batalha política tomou conta do Congresso, em uma disputa pelos recursos de exploração do Pré-Sal, que já foram divididos entre os Estados da Federação antes mesmo que sua viabilidade técnica e econômica justificasse a euforia inicial.
Diante desse cenário, talvez a Moratória da Soja não tivesse importância tão relevante para a conservação do Meio Ambiente, não fosse o papel determinante da floresta na regulação do clima da América do Sul. Ocorre que o desequilíbrio climático causado pela devastação da Amazônia afetará o Brasil a ponto de inviabilizar até mesmo os latifúndios do agronegócio, sem que esse setor da economia tenha dado sua contribuição efetiva para alavancar o desenvolvimento de nosso país. Houve, sim, um grande enriquecimento desses proprietários de terras, que se limitaram a aumentar suas fortunas pessoais, gerando pouco emprego em função da mecanização plena de suas atividades, pouco contribuindo, também, com baixa tributação de seus produtos, e gozando de incentivos fiscais que ofendem a dignidade de qualquer cidadão, que paga seus impostos.
Canteiro de obras da Hidrelétrica de Belo Monte |
Se os latifundiários nunca respeitaram o Código Florestal, em seus 50 anos de existência até a descaracterização promovida pelos ruralistas, por que o fariam agora, com a infeliz redação aprovada em 2012? E mesmo o fazendo, sua nova redação propicia alternativas suficientemente "flexíveis" para se acabar com a quase totalidade de nossos biomas. Estima-se que mais de 50% da Amazônia poderá ser, legalemente, derrubada pelos latifundiários, graças ao novo código, apenas pela redução das áreas de preservação permanente e das reservas legais. Aliás, em assentamentos do INCRA essas reservas sequer existem mais, devido à omissão desse órgão e da falta de punição dos infratores. Os assentamentos são a evidência do efeito "dominó" sobre as vicinais da Transamazônica!
Se a brilhante contribuição de Aziz Ab´Saber, para que se elaborasse um Código da Biodiversidade, era uma utopia inadmissível para nossa primitiva sociedade de consumo e de desperdício, esse novo "Código Ruralista" será uma sentença de morte a ser aplicada à Natureza, em doses homeopáticas, para que a vítima (nossa Nação) não perceba que está sendo entorpecida por um veneno letal...
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