segunda-feira, 5 de julho de 2010

A herança política de Luiz Inácio

Quando Luiz Inácio assumiu, nos idos de 2003, era apenas um ex-sindicalista que tinha perdido um dedo numa prensa de montadora de veículos, e que mobilizou milhares de trabalhadores nas intermináveis greves dos anos 60 e 70. Nos estertores do decepcionante governo de Fernando Henrique a inflação voltava a crescer, assim como o dollar e a taxa de juros, fruto das ameaças das forças mais conservadoras e preconceituosas desse país. Vivíamos mais uma crise internacional, quase não tínhamos reservas monetárias, pagávamos com dificuldade os juros dos empréstimos com o FMI e nos subordinávamos às suas regras autocráticas, sem reação.

O saldo da venda das estatais não fora suficiente para cobrir nosso endividamento crônico com bancos internacionais, nossos empréstimos amargavam taxas de juros inaceitáveis, e boa parte da dívida flutuava com o câmbio das moedas estrangeiras. Para piorar esse quadro, as Federações e Confederações das Indústrias e Comércio alardeavam uma provável debandada do capital nacional caso Luiz Inácio vencesse as eleições.

Certamente, Fernando Henrique não deixou apenas o caos e sua imagem arrogante de "Déspota Esclarecido", figura trazida da história que ele mandou que esquecêssemos quando se elegeu presidente. Deixou também uma lei, apelidada de "Responsabilidade Fiscal", idéia simples e óbvia como devem ser as boas criações mentais: não se gastar mais do que se ganha, princípio que qualquer cidadão, mesmo pouco esclarecido, sabe que é indispensável para não ter seu nome pendurado nos CDL's e SERASA's.

Mas o que Luiz Inácio deixará como herança, afinal?

Nossas dívidas com o FMI foram zeradas; nossa balança comercial apresenta sólido e sustentado superavit há muitos anos; nosso mercado exterior não está mais atrelado aos Estados Unidos e uns poucos países europeus, nossos maiores credores, mas diversificada entre países emergentes, países africanos, nossos vizinhos latino-americanos; o Brasil é respeitado internacionalmente, mesmo diante da figura quase grotesca de nosso Presidente, graças à sua espontaneidade e inteligência fenomenal; passamos pela pior crise econômica da história contemporânea, maior até do que a crise de 1.932, com reflexos modestos em nossa economia, se comparados às tragédias dos países desenvolvidos: Estados Unidos, França, Alemanha, Itália, Inglaterra, Japão, Espanha... graças a todas as medidas eficazes do governo petista, saímos da crise com um crescimento do PIB estimado em 7,5% para este ano!

Mas Luiz Inácio não se preocupou apenas com a economia: cuidou do funcionalismo público, recuperando salários e estruturando carreiras, e tornando os empregos públicos altamente competitivos em relação ao mercado de trabalho das empresas privadas. Hoje, qualquer jovem que ingressa na vida profissional não negligencia a alternativa de um emprego público, graças à melhoria da qualidade de gestão administrativa do funcioalismo e das empresas públicas e do aparelhamento dos órgãos públicos. É importante ressaltar o excelente trabalho que vem sendo deselvolvido pela Polícia Federal no combate aos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de drogas, restaurando a dignidade do poder público, a despeito da morosidade do Poder Judiciário e dos escabrosos casos de corrupção que continuam acontecendo.

A Educação e a Saúde Pública foram dois aspectos relevantes dessa administração, que apresentou modesta porém consistente melhora de seus indicadores, principalmente nas regiões mais desfavorecidas de nosso país. A nota distoante foram as políticas relacionadas com os movimentos sociais, principalmente no caso da Reforma Agrária, que caminhou lentamente diante dos privilégios concedidos, justamente, aos grandes fazendeiros latifundiários e ao agro-negócio, que chega agora a ameaçar destruir todas as conquistas alcançadas em mais de 50 anos. A pior delas á a ameaça ao meio ambiente, representada pela revisão do Código Florestal e de toda legislação ambiental, cedendo aos interesses da corrupta bancada ruralista do Congresso Nacional. Com a saída de Marina Silva do Ministério do Meio Ambiente esses poderosos fazendeiros perceberam a oportunidade de jogar no esgoto as nossas melhores políticas ambientais.

O Nordeste foi o beneficiário de boas e más políticas. Dentre as boas decisões podemos citar as melhorias no saneamento básico e na educação, bem como o estímulo à economia regional, reduzindo as enormes disparidades com o sul-sudeste. No entanto, essas políticas não foram suficientes para reverter as tendências futuras, uma vez que, com a recuperação da economia, também a poderosa indústria instalada no país cresceu a ritmo acelerado. Muito mais haverá que se fazer para que essas disparidades possam redimir da pobreza e da miséria essas populações carentes, que vivem hoje como vivíamos há 50 anos.

Nessa breve análise das heranças políticas de nossos recentes presidentes da república poderemos constatar que, a despeito dos diferentes partidos políticos no poder, adquirimos um status de Nação amadurecida, capaz de superar divergências ideológicas e trabalhar para o bem comum. Resta esperar que mudanças positivas cerceiem a liberdade dos corruptos e impeçam que seus representantes legislem em causa própria; que novas leis venham para proteger nosso povo e nossas riquezas naturais e não para favorecer interesses escusos de latifundiários que sequer honram seus compromissos. Finalmente, que o povo brasileiro seja respeitado e tratado com equanimidade, e tenha acesso à cultura como qualquer herdeiro de nobres decadentes possui; que a educação pública nada deixe a desejar às escolas particulares e a saúde pública torne desnecessários os milionários planos de saúde que só atendem a uma minoria privilegiada.

Promessas de campanha nada significam. Mais importante é o caráter de nossos líderes! Será que poderemos ter esperanças no futuro?

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