quinta-feira, 24 de maio de 2012

CARTA ABERTA DA ABECO À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA DO BRASIL SOBRE A REFORMA DO CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO


BY GPME,ON MAIO 23RD,2012

Campinas,21 de maio de 2012
Excelentíssima Senhora
Presidenta Dilma Rousseff
Presidenta da República Federativa do Brasil
Senhora Presidenta,
Na condição de Presidente da Associação Brasileira de Ciência Ecológica e Conservação, escrevo-lhe em nome de nossos associados e de outros cientistas brasileiros que atuam na pesquisa,ensino e aplicação do ciência ecológica no país.
Quero manifestar,de início,apoio completo às preocupações e recomendações contidas na Carta que a Academia Brasileira de Ciências e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência lhe dirigiram em 17 de maio de 2012,bem como o documento mais detalhado destas duas sociedades científicas.
Não há sentido em repetir as ponderações e argumentos detalhados naquela carta. Há,porém,alguns pontos que,em nosso entendimento,fundamentam razões substantivas para revisar muito criticamente o projeto aprovado no Congresso e que aguarda sanção presidencial:
1) A Presidência da República tem,dentre suas mais significativas incumbências,a custódia do Patrimônio Natural do país. Este Patrimônio não é estático e imobilizador mas,ao contrário,representa o Capital Natural do Brasil.
2) O Capital Natural brasileiro não é,nem pode ser,circunscrito a Unidades de Conservação. Ele permeia também todas as áreas ocupadas e habitadas,onde é base de condições de qualidade de vida,habitabilidade e produtividade. Assim,este Capital deve ser reconhecido como produtivo e como componente essencial da sustentação atual e sustentabilidade futura da vida e atividade humanas. Isto,sem mesmo considerar seu potencial para desenvolvimento de novos usos,processos e produtos.
3) Visto desta perspectiva mais abrangente,o Código Florestal é um dosalicerces da Legislação Ambiental brasileira e uma das bases para assegurar o Capital Natural da Nação.
4) Perante tal perspectiva,o atual processo de reforma do Código Florestal se apresenta precário e manifestamente inadequado. Ao invés de significar um genuíno avanço e necessária atualização da Lei,o projeto ora encaminhado agrega enunciados ambíguos e jogos de palavras que se destinam evidentemente a tornar essa lei tão inócua quanto for possível. Pior do que a estranha anistia a ilícitos recentes,é o amplo espaço que esse projeto abre para práticas futuras,quase desoneradas de respeitar a integridade funcional do ambiente que é – ou deve ser – o objetivo maior deste Código.
5) O Brasil necessita e merece uma legislação ambiental que contemple a produção e exploração efetiva agropecuária e florestal,erigindo normas que assegurem sua qualidade e continuidade futuras. Tais objetivos não serão atingidos sem que a integridade de  ecossistemas,de seus processos e serviços,sejam amplamente assegurados e recompostos onde e conforme necessário.
6) Não há viabilidade de longo prazo possível se produção e habitação,por um lado,e preservação ambiental,por outro,forem sempre postos em confronto em vez de serem extensamente e efetivamente integrados. Este é bem o contrário do processo pelo qual se gerou o projeto em pauta.
7) Poucas decisões serão tão difíceis de serem retificadas futuramente,caso necessário,como as que concernem a legislação ambiental. Deliberações sobre a economia,educação,saúde ou outras demandas sociais podem ser melhoradas ou retificadas no âmbito de alguns anos ou de uma geração. Porém,decisões que comprometerem a integridade ambiental e solaparem o Capital Natural do Brasil levarão décadas para serem corrigidas,isto se não se revelarem irreversíveis.
Quero concluir reiterando,em nome dos cientistas brasileiros que atuam profissionalmente na área ambiental,a estranheza que o Brasil se permita ignorar seu substancial capital de conhecimento e competência científicos,que deveriam ter sido amplamente engajados no processo de revisão do Código Florestal brasileiro. Em sua quase totalidade,esses cientistas foram formados e capacitados com financiamento público,e a maioria pertence a quadros de universidades e instituições de pesquisa também públicas.
Estão,por isto mesmo,claramente comprometidos com os interesses maiores do país e de seus cidadãos. Num processo sensato de revisão da legislação ambiental,caberia aos cientistas desta área apontarem erros do passado que não deveriam ser repetidos,e oferecer balizamentos,embasados em pesquisa e análise sólidas,para as melhores alternativas que se apresentarem. Infelizmente,não é isto que ocorreu até o momento.
Confiante de que Vossa Excelência considere as razões expostas ao deliberar sobre assunto de tamanha importância e gravidade,subscrevo-me
Respeitosamente,
Thomas M. Lewinsohn
Presidente da ABECO

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